31 de julho de 2000
Vós que paris Rosa dos Ventos

O Rio é uma cidade de ventos. Quem observa sua geografia, a maneira como a linha do litoral se dobra de repente para "dentro", o modo, enfim, como a Baía de Guanabara toma forma, ao mesmo tempo concha que recolhe e dinâmo que faz o vento rodar sobre si mesmo para ganhar novo impulso e direção, tudo isso, intuitivamente conduz o observador atento e vagabundo, a considerar que é no Rio que o vento faz a curva... E diria mais o observador se, além de atento e vagabundo, fosse também um delirante: ele diria que é exatamente na esquina das ruas Dois de Dezembro e Catete que o fenômeno ocorre, ou é ali ao menos que ele é mais sensível. É ali que vento ronda. Ali a gente sente primeiro quando o vento entra Baía adentro, vindo do mar...
Será? Eu, na verdade, não entendo nada de ventos e menos ainda da rosa dos ventos - mas que lindo nome não daria - Rosa dos Ventos. Personagem, mulher ou pseudônimo, que figura seria...
No catálogo não há nenhuma família Ventos ou dos Ventos.
Há os Ventania - que é um modo do vento, quando ele é forte e breve, mas já não dá o mesmo efeito: Rosa Ventania não soa igual a Rosa dos Ventos :

- Qual o seu nome?

- Rosa dos Ventos... (e para não que não soe muito estranho, ela completaria, à maneira de James Bond) Caetano... Rosa dos Ventos Caetano....

Seria Rosa minha mulher ou minha filha? Supondo que é mais fácil criar uma Rosa dos Ventos do que encontrá-la pronta, concluo que Rosa dos Ventos Caetano é minha filha... Quem a parirá é outra história...

Parirá... Você sabia que, por uma dessas maluquices do idioma, o verbo parir não se conjuga no presente - nem na primeira, nem na segunda, nem na terceira do singular? Quer dizer, nem eu, nem tu, nem ela - parimos. Sim, porque só nós parimos. E vós também, vós paris - o que soa muito chic... Vós paris Rosa dos Ventos - para quem dizer a frase? Essa é a história...

Mas, enfim, nem eu, nem tu, nem ela - só nós e vós. Tem uma coisa bonita nisso, se a gente quiser.. É que faz do ato de parir um ato plural, de dois indissoluvelmente... Eu se inventasse uma religião hoje acabava com o casamento, mas deixava o batizado. Bastava.
Outra coisa bonita é que não faz sentido dizer ele: parir é um verbo exclusivamente feminino... Existem outros? Ou algum exclusivamente masculino? Não vou parar pra pensar, mas acho que não...

Afinal, eu fui falar em rosa dos ventos e me perdi... Divaguei... Mas o que eu ia mesmo dizer de útil e educativo era que, por contas justamente dessa facilidade em divagar, instituí para consumo próprio o seguinte critério: o Cristo olha para a luz, para o leste, de costas, claro, para o poente, com o sul à direita e o norte à esquerda... No Rio, pingo é letra e o Cristo é bússola.<