22 de outubro de 2001
Os senhores da guerra

Seja lá quem tenha sido o responsável pelo atentado em Nova Iorque, uma coisa é certa: foi tudo, menos um ato em favor da criação de um estado palestino. Mais até: foi um ato contra. O primeiro indício dessa hipótese saiu publicado quase secundariamente nos jornais americanos e, que eu tenha lido, nem sequer foi mencionado nos jornais brasileiros. Parece que o governo Bush iria anunciar na Assembléia Geral da ONU - que estava marcada para a última semana de setembro! - seu apoio à retomada das negociações de paz entre israelenses e palestinos, visando, claro, à criação do estado palestino. O atentado adiou a Assembléia e, de certo modo, tirou dos EUA a iniciativa diplomática: qualquer ação americana agora ficará sempre suspeita de ter sido tomada sob pressão do terrorismo.

O outro indício, ainda mais forte, foi o assassinato do ex-ministro israelense, na semana passada, por um dos muitos grupos radicais islâmicos. Esses grupos com certeza sabem que a criação de um estado palestino significa, em contrapartida, o reconhecimento da legitimidade de Israel.

Até meados dos anos 80, a luta dos palestinos para tomar posse das terras que por direito lhe são reservadas pela mesma resolução da ONU que criou o estado de Israel, se confundia com a luta de todos os árabes para expulsar os israelenses do Oriente Médio. De certo modo, os palestinos era a ponta de lança - ou a bucha de canhão - do movimento árabe contra Israel. Depois da paz em separado do Egito, do "esfriamento" da Arábia Saudita e da Líbia, do cerco americano ao Iraque e das recentes aproximações de Israel com Síria e Jordânia, os palestinos ficaram isolados.

Arafat, de certo modo, caiu na real. Viu que o mais sensato, a esta altura, é focar a luta na criação de estado para seu povo e aceitar a existência de Israel como fato consumado. Aliás, que eu saiba, os árabes nunca fizeram muita coisa pelos palestinos. Serviram-se deles para fustigar Israel, mas grana, investimento, empréstimo - enfim, a cor do dinheiro dos bilionários do petróleo - que eu saiba, os palestinos nunca viram... Nem dinheiro, nem apoio: nenhum país árabe se preocupou em de fato acolher os refugiados palestinos e integrá-los na vida política e econômica de seus países.

Enfim, agora que, bem ou mal, até o próprio Sharon já admitia a criação de um estado palestino, os terrroristas assassinam o tal ex-ministro israelense. A mensagem é óbvia e clara: o objetivo é destruir Israel e não, construir um estado palestino. Com essa gente, portanto, não há diálogo possível. As negociações entre israelenses e palestinos terão de caminhar com ambos os lados sabendo que durante um bom tempo as duas nações terão de enfrentar a oposição interna de radicais e terroristas - judeus e palestinos. Ao terror, óbvio, não interessa a paz. Nenhuma paz. Em lugar nenhum.

Mas quem é o terror? Quando disse no início "seja lá quem for que tenha cometido o atentado", quis dizer que tudo isto foi planejado bem demais para um bin Laden só. Essa rede é muito mais complexa do que se pode sequer imaginar sem cair naquelas teorias conspiratórias que ocupam páginas e páginas da Internet. Até agora, cinco semanas depois do atentado, a iniciativa ainda é dos terroristas. Porque não houve um só gesto americano de retaliação que não fosse previsível. Enquanto os Jetsons continuam atacando os Flinstones no Afeganistão - sem nem mais saber em que atirar - ainda não se conseguiu sequer um indício mais consistente da participação de bin Laden. Nenhum cúmplice preso, nenhuma célula estourada. Nada. Não duvido da participação dele, mas essa ausência de rastros me inquieta. A prova mais evidente do envolvimento dele foi o assassinato, dias antes do atentado, por suicidas disfarçados de jornalistas, do único líder de oposição capaz de unir os afegãos contra o Talibã.

Mas dizer que é ele o único responsável por tudo? Desde "O Resgate do Soldado Ryan" até "O Gladiador" em venho repetindo entre amigos que os EUA estavam se preparando, e a nós, para a guerra. Foram filmes e mais filmes pregando a versão ocidental da jihad islâmica: a guerra justa. A mensagem era sempre a mesma: existem causas pelas quais vale a pena morrer. Eu digo: não vale a pena morrer. E ponto final.

Ninguém, aliás, me tira da cabeça que "O Resgate do Soldado Ryan" - um filme de quinta categoria sob qualquer ponto de vista! - foi feito sob encomenda para esvaziar o impacto de "Além da Linha Vermelha" - esse sim, não só uma obra de arte cinematográfica, como também uma genuína mensagem pacifista.

Não sei, pode parecer paranóia minha, mas "eles", os senhores da guerra, em pouco mais de um ano, já levaram a guerra para o Oriente Médio, agora estão no Afeganistão e se aproximam da Caxemira. A gente que abra o olho, porque o próximo alvo é a Colômbia. Quer apostar como a coisa vai esquentar por lá?