6 de outubro de 2003
Um pouco de tudo

O problema das novelas é que elas acabam quando começam a ficar interessantes... É o velho ritmo dos folhetins dos séculos passados: apresentação, desenvolvimento e fim - feliz, claro, porque se trata sempre de uma fábula moral. Só que, por não sei quê mudanças e evoluções, o mais interessante parece ficar no meio...

Pegue "Mulheres apaixonadas", por exemplo. As tramas criadas por Manoel Carlos, em algum momento lá do meio, se tornaram interessantes (desculpe o leitor a repetição do termo, mas não me ocorre outros sinônimo senão curioso/curiosa).

O amor de uma vamp vip de um charme alienado que beirava a psicose por um padre italiano perdido entre os nativos era um barato, que só no fim se consumou. Ora, justamente o "curioso" seria vê-los vivendo junto, "o padre que casou com a vamp" (para os mais velhos: algo como se Spencer Tracy em vez de Catharine Hepburn tivesse se casado com Audrey Hepburn...)

Mesma coisa o Téo.. Ele vivendo com aquelas criancinhas era algo a ser visto e explorado e não ser tomado como "o fim". Sei lá, talvez a maioria dos telespectadores prefira assim mesmo, o velho e bom modelo do folhetim com final feliz. Digo não sei, porque não acredito em pesquisa. Pesquisa mede a tolerância de alguém para algo. Só isso. Daí a gostar, é outra coisa. Melhor dizer que no horário o público não tem escolha melhor. E de fato é dificil competir com as novelas da Globo. É um produto bem feito.

Por outro lado, é dificil aferir o quanto o público toleraria uma mudança do esquemão folhetinesco, mas o sucesso das sitcom (pra quem não sabe, SITuation COMedy ou comédia de situação) americanas e dos big brothers da vida mostra uma tendência, uma curiosidade sobre o cotidiano, o curso da vida, isto que é o "meio da história". E prefere por ficar por lá, cético de que existam de fato fins definitivos. Gente para quem até o fim é provisório.

Quem ousará fazer a primeira novela assim - talvez até mais longa do que as outras ou não tão artificialmente alongadas com estas? Mesmo "Mulheres Apaixonadas", que em certo momento, oferecia o luxo de personagens ambíguas, no fim seguiu o manual e engrossou o caldo: quem era ruim, ficou pior, quem era meio doido, pirou de vez, quem era bom, passa a concorrer à beatificação. Eu honestamente acho um saco e sei que não estou sozinho.

Por que não chamam o Andrucha pra fazer uma novela? O SBT aparentemente está caindo aos pedaços. Nao era hora do Silvio se associar a gente de sucesso fora do velho circuito?Falo do Andrucha porque me parece o mais televiso desses diretores de cinema (O Guel é um diretor de TV que faz cinema). Mas poderia ser qualquer um que soubesse juntar essa tradição folhetinesca de novela longa, com o "foco no cotidiano" das sitcom.

Alerto ao leitor que falo sobre o tema com a fluência dos ignorantes: não sou um espectador de TV. Pra se ter uma idéia, minha televisão nem antena tem e mais parece uma sessão espírita de tanto fantasma. Aliás, eis aí um dos segredos da Globo: o sinal é ótimo.

Mas uma noite dessas, sexta acho, estava vendo a cena da Lavinia com o padre e pensei tudo isso.. Quer dizer, pensei depois. Na hora, imaginava "Se o Papa visse, morria mais cedo..". Mas não deixa de ser uma coincidência tragicômica... As metáforas infernais de Lavínia falando em fogo e labaredas para seduzir o padre enquanto o mundo segue a crônica da morte anunciada de João Paulo II...

Apesar de inegavelmente conservador, simpatizo com João Paulo, com sua obsessão peregrina. E tenho a impressão que preparou o terreno para eleger seu sucessor o primeiro papa negro. Minha aposta (aposta mesmo): Wilfrid Fox Napier. Um franciscano negro da África do Sul.