3 de novembro de 2003
Muito prazer, Clarah Averbuck

Já passa de meia-noite, a madrugada de sexta-feira mal começou, e acabo de conhecer Clarah Averbuck. Conhecer é modo de dizer. Nos vimos. O que já é muita coisa para duas pessoas que só se falam por telefone e e-mail. Tudo muito rápido. Ela e o Marcelo vieram de São Paulo para o Tim Festival e a viagem parece que foi uma epopéia memorável. Acabaram de chegar e passaram por aqui para pegar uns convites. Eu já a vira em fotos. Ela, até então, me deixaria passar em branco se cruzasse comigo na rua.

Sou um leitor antigo da Clarah, um admirador de seu poder de narrar. Como ela só tem 23 ou 24 anos, pode-se dizer que é um dom. Algo natural, que nasceu com ela. Pássaro voa, Robinho dribla, Clarah conta histórias. Todos, com a mesma naturalidade rítmica, exercem não um ofício, mas um modo de ser.

Clarah é da espécie dos narradores e como tal, tem o "tempo da emoção": no espaço de uma crônica, mais ou menos 600 palavras, a métrica de suas frases nos conduz a um jogo de sentimentos e idéias que, uma vez começado, já não podemos largar, gostemos ou não, fisgados pelo texto. Enfim, Clarah emociona e faz rir, alicia e provoca, adoça e inflama. E tudo que um leitor quer é sentir-se encantado.

O prazer que tenho de ler Clarah é o mesmo que tenho de publicá-la. Aliás, ela e o Cuenca -outro exemplar da espécie dos narradores. Ter os dois aqui no BIS significa tentar forçar a crônica a voltar a ser um domínio de escritores e não de jornalistas.

Mas, como eu dizia, para um leitor, conhecer pessoalmente um autor que admira é sempre uma emoção contraditória. A leitura cria uma espécie de intimidade silenciosa e distante, que mais inibe do que estimula o encontro real. Porque o autor é sempre uma entidade singular, enquanto o leitor só existe no plural. E, cá entre nós, deve ser difícil aturar uma multidão, mesmo que venha personificada em um só sujeito.

De certo modo, foi até bom que não tivéssemos tempo. Clarah me deu um abraço meio sem jeito, eu abri meu melhor sorriso e trocamos algumas palavras óbvias. Mas deu para sentir a força de Lady Averbuck, o denso ritmo com que pulsa sua alma. E lá se foram os dois, ela e Marcelo, para o Tim Festival, com a cara mais animada do mundo, como se não tivessem acabado de encarar uma viagem de carro de São Paulo ao Rio.

E eu voltei para meu micro, companheiro inseparável, para bater esta crônica que só quer mesmo dizer uma coisa: "Muito prazer, Clarah Averbuck".