17 de janeiro de 2005
À tua volta

Me movo melhor à tua volta porque partilho com você a dúvida, a ânsia do perdão, a vontade do novo - o nexo que ata "sexo" e "perplexo" num jogo para além da rima e que tem o gozo não só como resultado, mas sobretudo como esquecimento momentâneo de si, desse "se" que somos, insolúvel (ou quase) pela velocidade com que se desenvolve: lento e, ao mesmo tempo, voraz; súbito na virulência, mas sempre presente sombra ameaçadora de toda ínfima felicidade...

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Ou porque também me acontece de temer a morte justamente quando tudo parece bem ou, ao menos, calmo: "Mal começou, mas acabará - é certo". E então também eu me ponho a contabilizar mesquinhamente o quanto de sofrimento futuro e o quanto de cobrança pode haver por trás de cada promessa...

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Ou, talvez, porque me sinto melhor assim, silencioso e quieto, enquanto você se move à minha volta e eu apenas olhos que são como peixes neste aquário de memória e sonho que carrego sobre os ombros - peixolhos que te percorrem os relevos do corpo em movimento - queres café, queres água, queres... - e se deliciam, nostálgicos, em te imaginar rios, grutas, mares e abismos - ocultos nessa carne sedosa e resistente ao assalto do tempo, que te poupa como se fosses mármore...

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E vais e vens e teu corpo se desdobra em sombras flexíveis e brilha, exato e elástico, jovem e, no entanto, maduro - e eu o aliso com meus olhos, dedolhos, desejolhos - e quando me dou conta, somos de novo uma mistura de peles e suspiros.

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Ou, talvez, porque agora, quando me vem o sono e preciso dormir, insisto em escrever, em ficar triste, triste de não sei o quê, talvez de saber que "me movo melhor à tua volta..."