20 de março de 2006
A Guerra das Sobremesas

Estávamos eu e Filipe Quintans num bar do Centro à espera de um café expresso quando um sujeito gordinho entra esbaforido e grita para o caixa no outro extremo do balcão:

- Vai ser a Guerra das Sobremesas!

Um silêncio sorrateiro se instalou entre os presentes, divididos entre a curiosidade e a fleugma. Mas o gordinho não tinha pressa: guloso, saboreava cada invisível bocado da tensão que se espalhava docemente no ar. Então avançou mais uma provinha:

- A eleição! A eleição vai ser uma guerra de sobremesas!

Os olhos de todos se atiçaram, dissolvendo o que restava da falsa indiferença que alguns ainda tentavam afetar a bordo de suas gravatas e óculos. Na outra ponta da cena, o caixa se mostrou um "escada" perfeito. Ergueu os dois braços e num gesto teatral conclamou o gordinho:

- Explica de uma vez, Moacir!

O balcão inteiro se voltou de novo para o Moacir, que de súbito assumiu a postura séria de um arauto de tragédia grega. Seus dedos gorduchos puxaram um lenço do paletó e passearam com ele pelo rosto suarento.

- Uma guerra de sobremesas! A eleição vai ser uma guerra de sobremesas!

O ligeiro pesar que acrescentara ao tom da voz ao repetir a frase só fazia lhe enfatizar a ironia. E então, guardando com cuidado o lenço no bolso, arrematou:

- Vamos ter que decidir entre o Picolé de Chuchu e o Pudim de Cachaça!

Estou rindo até agora. Eu, Filipe e provavelmente todos os nossos companheiros de balcão que naquele instante dispararam uma gargalhada uníssona.

De volta à rua, eu já quase podia ver - com os olhos delirantes da imaginação - os camelôs vendendo bonecos, adesivos e chaveiros dos candidatos.

- Olha o Picolé de Chuchu! Olha o Pudim de Cachaça! É dez real os dois! É dez real!

Será um sucesso, certamente.

(Mas só agora, depois de tanto rir, estou me dando conta da sinistra sabedoria da piada).