8 de maio de 2006
Big-Bang!

No mercado, cercada de frutas e legumes por todos os lados, a menininha pergunta, fulminante: - Mamãe, por que que tudo é redondo? Segue-se um perplexo e divertido silêncio: a mãe não sabe responder. O cronista não sabe responder. Quem saberia responder?

A menina vai em pé no carrinho, observando tudo com essa alegre seriedade que só as crianças sabem carregar nos olhos. Não deve ter nem cinco anos, mas assim de pé, podemos nos olhar bem dentro dos olhos um do outro. Percebo que ela mesma ainda reelabora a pergunta, tão surpresa quanto nós com sua extrema complexidade.

"Por que tudo é redondo?". Repito para mim a pergunta observando a alface americana, que acabo de ensacar, como se fosse uma das luas de Júpiter. Redonda como, de fato, a maçã, a laranja, a melancia, o mamão, as uvas... Até mesmo o que não é verdadeiramente redondo pode ser cortado em rodelas, admito, quando penso na banana, na cenoura, no aipim e tudo mais que se pode reduzir ao formato de um cilindro...

Menininha danada essa! Onde estará daqui a vinte anos? Vou lembrando de crianças geniais que conheci ao longo da vida e de quem perdi o rastro. Terão se tornado físicos, artistas, executivos de sucesso ou pessoas comuns como quase todos nós? Que expressão, enfim, terá ganhado sua, já naquele tempo, tão evidente inquietude?

Perdi a menininha de vista na confusão do mercado, mas a pergunta ainda está lá, enquanto espero na fila minha vez de pagar: "Por que tudo é redondo?". Deixo a mente devanear um tempo e nada. Mas só esse estado mental já é, em si mesmo, interessante: um fervilhante vazio, onde palavras e imagens se sucedem numa velocidade tão grande que nada chega a se completar, a durar o bastante para ser algo.

Até que, de repente, uma vaga imagem se forma: a de uma semente que é o centro de onde se irradia uma maçã, mais ou menos como a imagem de uma roda de carroça com seus raios. Ou ainda melhor: a explosão do Big-Bang! Imagine, leitor, se cada coisa fosse a micro-reprodução da inconcebível explosão original que criou o Universo inteiro! Do quase-nada de uma minúscula semente surge a maçã, em toda a sua exuberância e inteireza. Única e, ao mesmo tempo, todas as maçãs possíveis. Singular e eterna. Finita e infinita.

Imediatamente outra idéia se associa a essa intuição: a idéia de movimento. "As coisas são redondas porque essa é a forma mais fácil delas circularem", resumo assim, com o prazer do trocadilho. Ou dito de outro modo: "As coisas são redondas porque o movimento é a essência do Universo". Explosão e movimento: até que as duas idéias se combinam e completam muito bem!

E também não está mal para uma explicação elaborada às pressas numa fila de mercado com a intenção de responder à pergunta de uma menininha de olhos brilhantes.

Não, não sejamos mais exatos: para responder a mim mesmo que tanto me agito com essas profundíssimas perguntas infantis. E sejamos também honestos: adorei a resposta com se fosse um brinquedo novo e saí do mercado feliz da vida!