25 de setembro de 2006
A volúpia do absoluto

A fria manhã nublada e o contraste do café bem quente.
Os livros ao pé da cama, mais fiéis do que os cães, mais sábios do que os homens, e que às vezes levo comigo ao sair, mais pela companhia do que até pela leitura.
A meditação, uma hora imóvel e silenciosa que o corpo presenteia a si mesmo para se descobrir ínfimo, universal e único.
O amor, que é um outro corpo e uma espécie de pedagogia que me ensina o que está em mim e não nos livros.
A música que é sempre uma carícia inesperada.

As ruas, tão neutras com as margens de um rio por onde corre o tempo, essa ilusória forma do tempo que chamamos de História, e para onde afluem todos os presentes (cada um de nós) para formar o imenso corpo que é a vida, tão mais real do que qualquer História.

Os amigos, os meus amigos, que me inventam.
Os leitores, seres invisíveis que são como anjos mundanos a vislumbrar, pela leitura, sua divindade. Os leitores, a verdadeira carne dos livros, seus genuínos autores. Os leitores, razão de ser da literatura, a quem, só por isso, nenhum agradecimento será jamais suficiente.

A crônica, semanal, regular: crônica - como se diz de tudo que dura e persiste.
Esta crônica, pequena e detalhada lista do que realmente importa; do que realmente é. Pequena e detalhada lista das coisas a que me apego quando me toma a indignação, a perplexidade e a tristeza por tudo que ocorre na ficção chamada país.

Quem antes se dizia diferente, melhor, hoje se confessa igual - o que o faz muito pior, porque duplamente mentiroso. Seu único argumento: "Eu pago mais", aos bancos e aos miseráveis. Levou-se para o planalto, a política do morro, que combina violência e esmola. O que aconteceria se, quase por acaso, a trama não tivesse sido descoberta? A oposição estaria sendo massacrada.
"O poder corrompe. O poder absoluto corrompe absolutamente".
A volúpia do absoluto ameaça nos conduzir de volta à ditadura.