Uma igrejinha

Entre as muitas razões sentimentais que o levavam a subir até Santa Teresa a mais recente era visitar a igrejinha dedicada à santa que dá nome ao bairro. Pequena, quase sempre vazia, incrustada no meio de uma ladeira íngreme que parece levar a lugar nenhum, a igrejinha ergue valente suas torres para o céu, mais em louvor do que em apelo.

Talvez por isso gostasse tanto de ir lá e ficar um tempo sozinho, aconchegado naquele silêncio banhado pela luz colorida dos vitrais. Sempre havia o latido insistente de um cão, o burburinho de crianças brincando longe, vozes vindas da sacristia, um carro passando lá fora – sons, enfim, que impregnavam de vida a elegante construção toda de pedra por dentro que parecia pairar fora do tempo – não fosse a indiscreta presença de lâmpadas e auto-falantes. “Se essa igreja, se essa igreja fosse minha”, ele pensava, “as missas seriam à luz de velas e de viva voz”. Sim, se por alguma razão improvável ele se tornasse muito rico de repente, adotaria a igrejinha e sua única exigência seria a abolição da eletricidade e seus confortos tão pouco espirituais. Em compensação, compraria um órgão e manteria um coral. Um coral só de crianças. Sentia falta de uma igreja assim…

Cumprido o ritual quase mecânico – mas nem por isso menos genuíno – de rezar as duas ou três orações que sabia, deixava-se ficar lá, sentado, quieto, como se meditasse de olhos abertos. Achava de uma imodéstia imperdoável não pedir alguma coisa, mas o que mais fazia era agradecer. Agradecer enfaticamente por tudo, minuciosamente tudo que lhe acontecera na vida. Porque, afinal, o mal que lhe coubera fora tão pouco que, se olhasse com justiça, veria que nem mal era: apenas sua vontade não satisfeita. Mas, sabe-se lá, se a vida teria sido melhor se tudo sempre tivesse corrido como ele desejara? Não, certamente não…

A simpatia que sentia pela igrejinha acabara por alcançar também a santa – tão humana, tão de carne e osso, ao contrário de outros santos que se revestiam de uma aura quase mítica. Havia algo de mundano em Santa Teresa que a aproximava da gente comum, com suas dúvidas e vaidades, com suas mesquinharias e grandezas.

Naquela tarde, ele a levara a igrejinha – para agradecer. Agradecer pequenos resultados que uma fé singela quis tingir com as cores vibrantes do milagre. Era engraçado estar com ela numa igreja – e ainda mais numa igreja vazia, só deles. Ficaram os dois em silêncio, lado a lado, gostosamente tímidos. Sim, sentia-se mais rico por incorporar uma igreja à paisagem desse amor tão incomum, tão conturbado. Não demoraram muito, mas saíram de lá mais felizes e um pouco noivos.

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