Soltem Caroline!

Caroline Piveta da Mota está presa desde o dia 26 de outubro, quando foi flagrada pichando uma parede branca de um prédio público no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, onde os curadores da Bienal, Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen, combinaram ver um “patrimônio cultural”.

Em 1917, Marcel Duchamp resolveu testar o presumido vanguardismo da Sociedade dos Artistas Independentes, de que ele mesmo fazia parte. Fundada um ano antes em Nova York, a sociedade preparava sua segunda exposição de “arte moderna” e se proclamava aberta a todas as tendências.

Conta a lenda que, ao passar pela vitrine de uma loja de material de construção, Duchamp viu na vitrine um desses mictórios de banheiro público masculino e ali mesmo teve uma idéia simples: virou o mictório de cabeça para baixo e, no topo tornado base, assinou sob pseudônimo e datou: “R. Mutt, 1917”. Entitulou a peça de Fountain (Fonte) e a enviou para a tal sociedade que, depois de muita discussão, decidiu rejeitar a participação dela na exposição daquele ano – sem saber, claro, quem era seu verdadeiro criador. Duchamp então se retirou da associação, denunciando sua caretice bocó.

Fountain tornou-se um ícone da arte contemporânea e, não fosse ela, nem mais saberíamos da existência da tal Sociedade dos Artistas Independentes de Nova York.

Talvez Caroline nem saiba quem é Marcel Duchamp. Não importa muito. Mas os curadores da Bienal, Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen, certamente sabem. Sua parede branca é uma espécie de longínqua sobrinha-tataraneta de Duchamp. Acontece que usar uma parede branca para “representar o vazio”, como disseram pretender Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen, a esta altura do campeonato, é de provincianismo pra lá de jeca.

E, com “a natureza abomina o vazio”, onde Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen viam uma parede branca, a garotada pichadora viu uma parede em branco. E resolveu usá-la para expor sua arte. Quem quiser discutir se é arte ou não deve buscar um contato com os falecidos curadores da tal exposição da Sociedade dos Artistas Independentes. E façam a gentileza de convidar Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen, eles se sentirão muito a vontade entre seus pares. Mas desconfio que Duchamp teria achado muito divertida a intervenção dos pichadores.

Se Caroline tivesse pichado o muro da casa de Ivo Mesquita, o prédio de Ana Paula Cohen, pintado bigodes nos bandeirantes de Brecheret, atacado alguma obra exposta na Bienal seria um ato de vandalismo. Até as pichações do lado de fora do prédio da Bienal também pode ser enquadradas assim.

Mas pichar a parede em branco da Bienal foi um “ato estético” legítimo, sancionado por quase cem anos de uma arte que a Bienal pretende representar. Maluquice mesmo é chamar parede em branco de “patrimônio cultural”.

O que a garotada disse para Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen é que não há vazio, nem mesmo falta de espaço. Longe de representar o vazio, a parede em branco de Ivo Mesquita e Ana Paula Cohen era, sem querer, uma representação da cegueira.

Então por isso, vou fazer desta crônica uma petição online sob o título SOLTEM CAROLINE!

O endereço é (http://www.ipetitions.com/petition/freecaroline).

Quem quiser, pode passar por lá e assinar.

É um ridículo absurdo essa moça estar presa por uma espécie de “atentado artístico” contra uma parede em branco.

9 Comentários

  1. Não acho q vc tenha desvirtuado nada, Luciana! Só quis chamar atenção para algo que vc também concorda: “O absurdo é o mesmo”. E isso é o que torna tudo mais preocupante.

  2. Desculpe, não pretendi desvirtuar sua campanha, que alias acho muito, muito pertinente, só achei que deviamos aproveitar todos os fatos que nos são apresentados, afinal o absurdo (nosso de cada dia) é o mesmo.

  3. Provavelmente a indignação sobre “os euros na cueca” (vc veja como eles acompanham as cotações!) está sendo exposta em outros blogs dedicados à política. Como no fim tudo se relaciona que cada um exerça a indignação que mais lhe apeteça.

  4. Não, claro que não, nem por um instante. O problema é que enquanto perdemos tempo e dissipamos energia discutindo pra onde vai a Caroline (segundo nossas leis e a interpretação que é feita delas, nem deveria estar presa) outros passeiam pelos aeroportos com dinheiro público nas cuecas, ora bolas, e onde está essa fervorosa indignação?

  5. A questão discutida não tem nada a ver com essa tola rivalidade entre certo tipo de paulistas e certo tipo de cariocas.

  6. rs, só rindo, por que parece piada. O cidadão está preocupado se a pichação ocorre no Rio ou em São Paulo, pois é meu amigo,se o cara é preso no aeroporto de Brasilia e o dinheiro era nacional (seu tb) e ai? vc manda ele pra onde afinal? Que tal se indignar de verdade?

  7. paulistanos não suportam masi paredes pichadas!!!!! que soltem caroline e mandem embrulhada pra presente para os cariocas…..caroline no rio já!

  8. Irretocável! Muito bom mesmo.Soa-me estranho a quantidade de pessoas que vaticinam: “Que fique na Jaula…, Que apodreça lá… etc.” Talvez seja uma herança do período autoritário, mas, é um fato curioso que tantos ignorem “o estado de direito” pois parece justo que Carolina possa responder em liberdade. Não é possível que cumpra pena antes do julgamento. Porque ela não conseguiu um Habeas Corpus até agora? O banqueiro Daniel Dantas conseguiu o dele em menos de 24 horas! O estado de direito no Brasil só vale para os endinheirados? Se for pobre fica na jaula, mesmo que seja pelo furto de um picolé ou por se expressar numa parede branca rotulada de “arte.”!!?

  9. que soltem a caroline e despachem direto no rio…..pra ela pichar, pichar o que bem entende e depois os trouxas pagarem e apagarem com seus impostos a merda que essa delinqüente e sua gang faz……quero ver se os intelectualóides cariocas vão achar que é arte…aliás o simples fato desta rebelde estar presa me irrita tb, pq ta comendo a custa de quem paga impostos….estar presa é prêmio….deveriam colocá-la pra desconstruir o lixo que fazem, limpar e pintar paredes pichadas ou monumentos públicos…..afinal desconstrução tb é arte

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