Haicais

1. Contraste (Anicca)
A borboleta azul
passa e beija o pé
do homem de branco

2. Tom sobre tom (Anicca)
No ar suspenso,
o colibri esmeralda
contempla o cacho.

3. Formas (Maya)
A cobra sonsa
sonha-se um galho
à beira do caminho.

4. Deuses (Maya)
A formiga admira-se
Da chuva monumental
Escada abaixo.

5. Sentidos (Vedana)
Ao sabor da trilha,
Escuto cheiros, dou cor ao vento
Sinto: quem?

6. Instante (Anicca)
Súbito, o sapo
Nem sabe quem saltou:
ele ou a lata?

7. Método (Magga)
O eucalipto ao vento:
As sensações são o vento;
Eu, o eucalipto. 

9 Comentários

  1. Captar esses flagrantes é uma delícia! Sinal de que estamos no presente, não é? Q não estamos simplesmente fabulando, fabulando entre o passado e o futuro, prisioneiros…

  2. Na verdade, Eduardo, era mesmo um eucalipto. Eu o vi se movendo ao vendo na noite do último dia do curso de meditação e foi para mim uma calma e secreta epifania: “É assim que se medita!”.Aliás, eu vi todos os haicais. a gente passa – ou tenta passar – os dias hiperconcentrados – e então de repente vc capturava um momento desses (o que não deixa de ser um sinal de distração, um desvio do propósito imediato da meditação…).Se quiser informação sobre o curso, tem um link para a página uns dois post abaixo.

  3. Talvez porque a mata seja bem mais barulhenta… (risos)Para mim a sonoridade da palavra eucalipto não compromete a harmonia desse haicai. Ficou muito bom assim. Aliás, todos são muito bons!Pensando na ideia de flexibilidade diante da ventania, imagino que bambu seria melhor que árvore, mas a melhor palavra é aquela que se associa à imagem daquilo que queremos dizer no momento em que o pensamento nos vem a mente. Essa é a palavra certa.Eduardo Prado

  4. Eu também! rsMas vou mudar o nome de “magga” (caminho) para “dhamma” (natureza, essência). O problema desse haicai é que “eucalipto” é uma palavra terrível. Originalmente, escrevi “árvore”. Mas me dei conta da imprecisão qdo o transcrevi para digital: não é qualquer árvore que é assim tão flexivel quanto um eucalipto ao vento e essa é a ideia. Então decidi sacrificar tudo – sonoridade, métrica – em nome da precisão do sentido. Mas ainda me remôo…O haicai me ocorreu exatamente assim, vendo como o eucaplipto se deixava levar pelo vento, sem resistência – sem “pensar”? Ou seria exatamente isso “pensar”?Aparentemente, a Natureza toda é “anata” (não-eu): não haveria singularidade mas exemplares da mesma espécie (forma)envolvidos na economia própria da manutenção daquela “forma de vida”. Então ainda que o homem enxergue “singularidades” (a abelha-rainha, o zangão, a operária, etc) o que há é um “organismo”. Então, ness sentido, os exemplares não pensam, é a espécie que pensa neles.Assim, a Natureza não pensa no sentido singularizante em que entendo o pensar humano (ter a consciência singular de uma singularidade), mas pensa – de um outro modo – ou do memso modo, mas em outro grau de complexidade.Nesse caso, a meditação teria o sentido de fazer a mente “recuar” em direção a esse “estado natural” de anata (não-eu), onde esse pensar singularizante (característico do ego?) se tornaria uma “hipersensibilidade”.Bom, isto é uma mera especulação intelectual, precária e provisória, que não deve de modo algum substituir a prática – árdua e eu diria mesmo “árida” – pois ao menos para mim meditando sinto-me muito mais num mar ou num deserto do que numa mata ou floresta.

  5. A poucos dias, comentando com um amigo oriental sobre o Twitter, chegamos a conclusão de que o haicai é perfeito para ele. Traduzir estados de espírito em poucas palavras é uma arte, coisa que pouco twiteiro sabe fazer.Gostei do último (Magga). Eduardo Prado

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