1 Comentário

  1. Introduzindo o O Bhagavad Gita como ele é, Swami Prabhupada desfia um argumento curioso: sendo Krsna O Desfrutador por excelência, somos – como tudo mais no universo – atores do seu desfrute, nada havendo de maior a cumprirmos senão o servi-lo, digo, proporcionar-lhe o quanto nos é possível em prazer. Em sendo suas criações possuíríamos também – é evidente que em proporção moderada – a mesma essência do Criador, pelo que somos instados por Sua Divina Graça Swami Prabhupada a exercer a servidão recíproca como via de acesso ao deus. Para surpresa geral, entende-se ao final desse prefácio que, ao contrário do que seria de supor num texto convertedor, o seu público-alvo é já, por natureza mesmo, fiel a Krsna. Pois, continua o raciocínio, servimos sempre uns aos outros, não só o operário ao capitalista (sic), mas também o contrário. Os motivos do pregador para apresentar semelhante conclusão, desprezada sua nacionalidade indiana, parecem evidentes quando se entende que a introdução foi escrita para a edição ocidental do seu comentário ao clássico védico.

    Parece que escorreguei do assunto da ‘máxima’ do Azevedo, mas acredito mostrar o quanto podem deslizar para quaisquer direções as idéias de ‘liberdades públicas’ e ‘direitos individuais’ (e mesmo de liberdades individuais e direitos públicos) quando cultivadas em meios distintos – no caso do guru, o meio religioso, ao menos em teo-ria alheio às questões da ‘temporalidade’. A sentença parece necessitar, para validar-se, de uma lista – ainda que modesta – de liberdades e direitos a serem (fundamentalmente) garantidos pela democracia. Excluídas as ditaduras ‘ditas esclarecidas’, para as quais o menor movimento do indivíduo é sinal de rebelião, fico a imaginar qual deve ser a atitude do governo na melhor das democracias caso um cidadão tenha sucesso em incitar uma revolução, mesmo que pequena. Seriam gentilmente abertas aos revoltosos as portas das assembléias de políticos, que em seguida se deixariam encarcerar, ou indicariam estes, depois da ‘cabível’ repressão ao movimento, os meios constitucionais de o cidadão promover as mudanças desejadas? A segunda parece ser a alternativa óbvia: e em sua estreitada corrente navegam como podem os cidadãos comuns, para lá e para cá, o mais das vezes entre resmungos, quando não acotovelando-se, enquanto numa e noutra extremidade do itinerário postam-se os gestores da ‘coisa pública’, remetendo os navegantes ora correnteza acima, ora abaixo.

    Como um todo o tema é nosso velho conhecido, mas é na forma a seguir que mais o freqüentamos nos últimos tempos. O direitO direito de ser pobre não me exige maior esforço do entendimento: imagino como seria negá-lo a quem o invoca e obrigar um renunciado, por exemplo, a resignar-se à prodigalidade ou ao luxo. Já para o direito à riqueza, em particular àquela cuja posse exclusiva ou quase exclusiva redunda em carência para os demais indivíduos, não consigo achar justificativa, menos ainda para os seus naturais corolários, todos ‘direitos’ também, é claro, mas não garantidos necessariamente em quaisquer textos de leis – ao contrário, são cunhados segundo a ocasião e têm preço de mercado compatível com a fazenda de quem se candidata a adquiri-los. E este (o direito à riqueza) parece ser ou de fato tem sido a mais cobiçada das liberdades públicas e o mais protegido dos direitos individuais, inclusive – ironia – por quem deles não goza nem tem a perspectiva de algum dia vir deles gozar. Detalhe: Prabhupada e um tanto mais de gurus recentes, naturalmente, não estáo incluídos no derradeiro grupo.

    Abraço,

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