a força da vida

Do galpão que desde antes de eu nascer havia ao lado do prédio onde moro restou um terreno de terra revirada. No entanto, como que do nada, na paisagem desolada, brotaram, silenciosas e obstinadas, umas plantas que, sob a ação do sol, do ar, da chuva, já se tornaram pequenos arbustos, dispersos entre poças d’água parada cheias de limo, terra ruim e pedaços de concreto e pedra. Nesse cenário de ruína e morte – onde reina uma paz como nunca antes – a vida de novo se insinua, sem alarde, avançando sempre, com sua força indomável e comovente.

1 Comentário

  1. Enquanto escrevia, lembrei de um filme que vi há muitos e muitos anos, talvez mais de uma vez, de madrugada na TV: Cool Hand Luke – se não me engano, Rebeldia Indomável, em português – com Paul Newman, George Kennedy e música de Lalo Schifrin.

    De 1967, o filme pode ser tomado como um símbolo daquela época, uma reflexão metafórica sobre a força da vida em confronto com o sentido que se tenta impor a ela, sobre a tensão entre a necessidade de um sentido comum e a radical liberdade que é o fundamento da vida – que todo tempo parece proclamar que a vida é já, em si e por si mesma, o sentido, único e suficiente, e tudo mais é coerção e engano.

    Essa é uma das poucas questões fundamentais da existência humana – aquela que, em termos modernos, opõe o individual ao coletivo, a liberdade à igualdade.
    No filme, uma das interpretações possíveis, mas certamente não a mais imediata, é perceber o quanto esse confronto pode se tornar estéril, opondo a tirania das instituições à ação sem sentido dos indivíduos, num embate que produz muito calor e quase nenhuma luz.

    De certo modo, o teatro do absurdo, e toda uma vertente da arte que chamamos, generica e quase irresponsavelmente, de “surrealista”, se enquadra aí. Uma arte que, a despeito da vitalidade de seu grito, como Luke, não conduz a lugar nenhum e acaba por ver na morte uma espécie de redenção negativa – identificada, me ocorre pensar agora, com a iluminação final do budismo, que não conduz a nada, simplesmente a cessação da roda cármica. (E aí, podemos perguntar, parodiando Nietszche: seria o modernismo uma espécie de… orientalismo?

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