21 de novembro de 2005
Nome e destino

Era um gato e se chamava Champanhe. Não sei se pela cor predominante do pelo, daquele amarelo pardo próprio dos gatos, ou por seus modos aristocráticos, que o mantinham distante e à parte. Ao contrário de seu irmão, bonachão e afetuoso, que, coincidência ou não, se chamava Nick.

Como todo mundo que freqüenta a Internet sabe, "nick" em inglês quer dizer apelido. Logo o gato não tinha um nome, tinha um apelido, algo que combinava perfeitamente com o seu jeito de ser.

Só isso já nos permitiria conjecturar, leitor, à maneira preguiçosa dos gatos: será que nome é destino? Não sei se, no nosso caso, os gatos fizeram jus aos nomes ou se o contrário, os nomes é que fizeram jus aos gatos. Sei que eles chegaram pequenos, bem pequenos na casa dessa minha amiga, que nunca antes tivera bichos. Então é bem possível que os nomes tenham sido dados ao acaso e depois foram ganhando esse sentido tão exato. Enfim, nomes e gatos foram se encaixando até parecer feitos sob medida um para o outro.

Eu poderia pegar agora o telefone, ligar para a Mazé, dona dos gatos, e resolver a questão. Mas, como eu disse, avançamos à maneira oblíqua dos gatos. Uma resposta objetiva e lá se vai a graça da conjectura. Além disso, fosse qual fosse a resposta, não seria suficiente para calar a pendenga, ensinam os manuais de boa metodologia. Assim, fiquemos, leitor ocioso, com a pergunta sem resposta, tanto no particular como no geral: nome é destino?

Bom, nem todo Napoleão é um conquistador, mas nestes tempos bicudos não custa evitar batizar o recém-nascido de Adolfo. Também poderia ser mais fácil e aceitável a pessoa trocar de nome. O sujeito podia simplesmente chegar no cartório e dizer:
- Olha, doutor, não quero mais ser César. Não combina comigo.
- E como você quer se chamar, meu filho?
- Eu quero mesmo é me chamar Joca, doutor.
E, em poucos minutos, o ex-César já seria um Joca feliz e satisfeito a desfilar pelo mundo sua voluntária coincidência consigo mesmo.

Entre os índios guaranis é assim. Ao nascer o pajé dá um nome à criança. Não um nome qualquer, escolhido ao acaso. Não, há toda uma ciência nessa escolha que pode levar dias. Depois, quando ele cresce, se não achar que o nome o traduz, ele pode trocar. Porque pajé também erra. Pode parecer doido, mas muita doença se cura com uma simples mudança de nome... Há quem sonhe ser Ulisses, mas há também quem prefira ser ninguém.

Mas a gente falava do Champanhe... Pois é, falava. Mas enveredamos, na metafísica dos nomes e aí ficamos, gastando o espaço e o tempo de uma crônica. Não faz mal. Fica o leitor convidado a pensar se nome é destino e eu obrigado a, semana que vem, contar a história do gato Champanhe.