12 de dezembro de 2005
M. L. Estefania

Livros. Às vezes, quando eu entro numa boa livraria e vejo tantos livros, me pergunto se não é muita pretensão querer escrever mais algum. Há tanto para ler que escrever parece uma vaidade exaustiva e inútil. Nessas horas, a primeira coisa que penso é: se não houvesse escritores menores Shakespeare, Machado de Assis, Fernando Pessoa teriam lido o quê?

Mário Quintana me disse uma vez que a literatura é uma corrida de bastão. O que importa é passá-lo adiante e manter o fluxo do pensamento. E é isso que fazemos, cada um de nós que se esforça para escrever algo que conquiste a atenção e o afeto do leitor eventual. Um sorriso, uma lágrima, uma idéia nova que germine em outra alma e o texto terá cumprido seu papel (desculpem, mas gostei deste involuntário trocadilho!).

Por outro lado, é difícil dizer quem são os escritores menores. Não vou parar para fazer uma estatística, mas muito escritores tidos hoje como grandes foram quase desconhecidos de seus contemporâneos. Em compensação, os escritores de sucesso daquela época foram esquecidos.

Por isso costumo dizer que o artista produz para os mortos e os não-nascidos. Sua relação com o presente é meramente circunstancial e casual. Na verdade (e isso a meditação ensina), o presente é o que nos escapa, acostumados que estamos a viver entre dois "se": o "se" do ressentimento e o "se" da vingança.

Eu tenho um exemplo doméstico que me agrada muito. A época da minha vida em que me senti mais próximo do meu pai foi quando nos tornamos leitores vorazes de uns livrinhos de bolso de faroeste de um autor de quem nunca esqueci o nome: M. L. Estefania. Eu tinhas uns doze anos e até hoje lembro dessa época com ternura.

Eram duelos, brigas e cavalgadas que a gente partilhava com calorosa parcimônia: não havia muito a comentar, nosso prazer era a certeza do terreno comum, quase secreto e, de certo modo, proibido. Havia outros livros, clássicos quase obrigatórios. Mas aquelas aventuras curtas e previsíveis, narradas com intrigante habilidade, tinham um sabor especial: eram mais do que histórias em quadrinhos e menos do que livros. Era como ir ao cinema ou comer cachorro quente.

Era bom, muito bom. Tão bom que, lembrei agora, uma das primeiras coisas que escrevi, alguns anos depois, foi o relato de um duelo no Velho Oeste... Talvez o que eu verdadeiramente quisesse fosse aquela intimidade com meu pai de volta. Mas, era tarde já, como sempre é tarde quando ainda nem vinte anos temos. Chegara o tempo da mais funda solidão e aquele relato, sem o saber, talvez fosse uma despedida.

(Mas viemos a nos reencontrar no silêncio muito mais tarde: essa história de pai e filho teve um final feliz)

Agora, pesquisando na internet, descubro que Estefania é quase um clássico na Espanha! Marcial Lafuente Estefania, mais de 3.500 livros escritos, segundo consta. Tenho para mim que os clássicos são clássicos porque estão em toda parte: quiça fosse Homero a reverberar por aquelas páginas.