A chuva de que falo na crônica aconteceu há quinze dias. Cheguei a fazer um post rápido, para registrar a impressão. Mas o que eu queria era captar num texto todo o poder da cena. A imagem era muito forte e, ao mesmo tempo, naquele momento era quase um segredo, tão longe estava. O sinal mais evidente era o surdo retumbar dos trovões, algo que me lembrou uma das cenas célebres de Casablanca: Isa e Rick estão na janela se beijando, enquanto do lado de fora ouve-se ao longe o ribombar dos canhões do exército nazista preste a tomar Paris. A mim, faltou uma Ingrid Bergman que dissesse: Foi um canhão ou é meu coração batendo? (“Was that cannon fire, or is it my heart pounding?”)
Sim, citei de memória a fala em português, mas não lembrava com era em inglês. Não precisei de mais do que três minutos para encontrar na Internet o roteiro original do filme! Para quem quiser, aqui vai o endereço, aliás, dois: este e este.
Explorem os sites, parecem bem interessantes, ainda mais se você é fã de Casablanca como eu.
Aliás, por conta dessa pesquisa, achei uma matéria, de abril de 2006, no Time Out London onde o roteiro de Casablanca aparece como o melhor de todos os tempos, na lista dos 101 melhores roteiros de todos tempos da The Writers Guild of America . Vale a pena baixar a lista só para comparar com as preferências de cada um.
E para o pessoal mais jovem, uma rápido comentário: há mais ou menos 20 anos, levei uns dois meses para encontrar esse roteiro – nem me lembro mais em que biblioteca – e só pude mesmo xerocá-lo…
Voltando à crônica, me pergunto agora se abusei dos adjetivos na tentativa de descrever objetivamente a cena. Minha justificativa é que havia poucos dados onde apoiar uma descrição: nuvens longínqüas, o cinza como cor dominante, a rua vazia, o quase silêncio de domingo à tarde. Passar então do plano objetivo para o subjetivo foi um movimento quase natural, ainda que daí em diante o texto tenha tomado um rumo inesperado.
O anônonimo fui eu, Rose Marinho Prado….não sei por que saí anônima…
Gosto dessa metalinguagem da sua crônica, interessante saber a circunstãncia em que foi escrita. Geralmente compositores musicais dão ao público seu processo criativo e ‘cansativo’. Como conseguir desenhar com palavras aquela nuvem que vivia lá e cá? Tudo é difícil, porque , geralmente, o texto cai, pronto. Ai!Mas é esboço, esboço com reboco – que cai. O resto é trabalho do escravo do texto, do escriba da criação que alguém d’alguma lugar jogou, do desenho e do desejo do que se quer dizer. E dizer é muito muito difícil. E um texto, enquanto não leva o verniz, é uma gosma grudada na gente, feito um feto. Bom e arrepiante. Não sou escritora, mas imagino que assim seja.