O corpo há de aprender sua lição e esquecer a história que carrega. Então seremos livres e nenhuma morte poderá nos alcançar. Inteiros e presentes, nada mais haverá de necessário ou urgente.
É tudo que eu sei dizer – a mim e a você – quando a vida parece revelar sua verdadeira face, violenta e sem sentido, e se reduzir a um jogo sem regras e, portanto, sem vencedores, onde um dia, todos serão nada. “Não, a vida não é isso”, é tudo que sei dizer e me esforço para acreditar: o que vemos não é violência, mas exuberância; não é falta de sentido, mas a exibição da mais absoluta liberdade.
Sim, é aterrador – quando se volta contra nós. Aterrador, cruel, injusto. Há dias, quase me afoguei. De um momento para o outro, o que era o distraído deleite de estar no mar, entre ondas de efervescente brancura, tornou-se o horror de uma força invisível me arrastando para fora, enquanto toneladas de água me empurravam para o fundo. Meus pés já mal tocavam a areia e quase não havia tempo de respirar entre um e outro mergulho. Seria a morte se, num esforço lúcido, eu não vencesse o terror que quase me paralisava. Tomei impulso numa onda menor, finquei o corpo no chão e agarrei a mão amiga que se estendeu em meu socorro. Estava salvo. O mar, o meu mar, indiferente, quase me tragara; e agora voltava a me afagar – mas esse prazer está em mim e não no mar, que nem sabe quem sou. O mar, insana fúria: vida. Deslumbrante, aterrador: indiferente. E nessa fábula resumo o que por agora sei dizer.
Na adolescência, por duas vezes, e há pouco tempo, uma outra vez, também quase me afoguei, envolta na incomparável sedução marinha, estado de esplendor que só mesmo o mar pra me dar – em todas as vezes: valões. Hoje contemplo a fúria marítima mais de fora do que de dentro do mar, o receio do inesperado ainda leva de mim a coragem pra vivenciar os ilimitados prazeres de estar imersa em águas que me ligam a todas as praias do mundo! No entanto, “na terra em que o mar não bate, não bate o meu coração”… Continuo adorando o mar como a um deus – ele me leva a um estado de graças -, mas prudência e canja de galinha não fazem males a ninguém.O mar, símbolo maior do inconsciente e, como este, mesmo e tão indiferente às nossas dores e prazeres.Beijo!
Querido Antônio, já senti essa força do mar uma vez, na Barra da Tijuca. Nadei para o fundo e na volta, percebi após algum tempo que nadava, nadava e não saía do lugar. Pânico. Uns rapazes que estavam próximos vieram para perto de mim e, juntos, conseguimos voltar. O mar é imprevisível como a vida. Há que se entregar, mas com consciência. Beijos, uma ótima semana!