Ler é ler o movimento. Dito de outro modo: o que se lê é o movimento. É claro, é óbvio, é algo que se pode dizer autoevidente. Mas eu nunca tinha pensado “isso” com essas palavras.
Sempre me impressionou que, no imenso séquito que acompanhava Alexandre em sua marcha “sempre em frente” (“Tout droit, monsieur! Tout droit!”) para conquistar o mundo, seguiam leitores de tudo: de nuvens, de pedras, de sonhos, de águas, de vísceras, e talvez de toda sorte objetos criados como ferramentas ou instrumentos de leitura do que “esta aí”, o mundo, recoberto de camadas e camadas de mais significado.
Ler o livro de Plutarco foi uma das epifanias que mudaram a minha vida. Outra, anterior a Plutarco, foi ter “lido” a noite com o auxílio de um mapa estelar, ter olhado para cima e visto aquilo tudo subitamente ordenado em constelações lindamente desenhadas pelo olhar de gerações incontáveis fazendo o mesmo gesto de curvar a cabeça para cima e olhar a noite – os trabalhadores noturnos.
Eu podia ver, literalmente, o Caos e o Cosmos, sobrepostos. Sem deixar de ser um só, o Céu era dois, era os Céus. Há nisso, nessa natural constatação toda uma metafísica que pode perturbar uma alma por toda a vida.
” ter “lido” a noite…Há nisso, nessa natural constatação toda uma metafísica que pode perturbar uma alma por toda a vida.”
Há, com certeza.
bjs
Não consigo entender as camadas de verdade. Meu pensamento ‘desfia”. Preciso de mais fôlego. Vou tentar. Obrigada.
Há nesses seus sobrepostos um antiidealismo – não há UMA verdade oculta sob UMA aparência. O que há são camadas de verdade, mais e mais verdade…
Eu entendi, é mais concreto. E todo mundo lê.
Ler é a ligação entre o momento 1 e momento 2 de que falo abaixo. É como se ler fosse uma linha unindo pontos… (Achei essa imagem boa).
Quis dizer algo mais concreto e fundamental, mais óbvio e nada abstrato.Digamos assim: é a diferença entre o instante 1 e o instante 2 que faz o conteúdo da leitura. A diferença é produzido pelo movimento – físico ou temporal. E isso alcança toda a natureza, pq todos lêem o movimento – para se mover!
É uma idéia bem simples mesmo e se transplantada para a nosso experiencia humana de leitura – seus olhos aqui, me lendo – talvez ela seja mais perceptível na escrita à mão, as letras se encadeandoem palavras e frases…
Há ler e *Ler.
*Ler, esse q vc trata, é sim! ler o movimento. Quem lê assim dispara alguma coisa dentro de si e sai andando num cosmos de dentro.
Só lê desse modo quem se move internamente. E só, quando se move.
E essa capacidade vibra – e vinga- , é na infância, esse dom que muitos dissipam. Nem todos, aí, você.