Para Mônica Reis
Venderam-me uma agenda quando já vai longe o ano. Com suas páginas letárgicas, todas em branco, ela antecipa o tédio, a aceitação e o esquecimento como os alvíssimos elementos que hão de me tecer os dias: idêntico vazio atravessado de humores.
Sim, o leve vazio da vida onde o que pesa são os humores. O tal ego que mal cabe na agenda. Ela vira então um convite a diminuir o ego até que ele coincida com o vazio – vazio dentro do vazio, numa inefável leveza de fazer corar os místicos.
Fiquem eles com sua teologia negativa! Eu adotarei a rígida psicologia negativa que a agenda me impõe: nada além de contas a pagar e outras tarefas inadíveis e impessoais. Todo o resto será o branco silêncio das linhas imaculadas. Nenhum projeto, nenhum desejo: a agenda será meu claustro!
E nas páginas dos dias irremediavelmente passados, habitarão os santinhos, para assim simular a eternidade. Eu tenho os meus prediletos, mas simpatizo com todos. Porque santo de verdade não tem ego: é puro amor.
Nem ego, nem agenda, é verdade. Agenda (e livros em geral) é coisa de aprendiz de santo (ou então é só uma chatice!).