Desautorizada esperança

Levai as almas todas para o Céu” – Nossa Senhora de Fátima nos ensinou a pedir a Jesus na oração do terço. E se ela nos diz que rezemos assim, pedindo por todas as almas, deve ser porque sabe que Jesus nos ouvirá: no Juízo Final, todas as almas serão salvas, seja por Justiça, seja por Misericórdia. A Justiça está reservada às almas do Purgatório; a Misericórdia, às almas do Inferno.

É tamanha a Misericórdia de Deus que até o sofrimento eterno terá fim: pois será eterno só enquanto durar a Queda. Aquele que sofre no Purgatório, sofre no tempo, como uma alma convalescente. E aquele que sofre no Inferno, sofre na eternidade, sem esperança – só a Misericórdia de Deus pode salvá-lo. E salvará.

Ao menos essa é a minha desautorizada esperança.

Por isso, contra todas as recomendações dos teólogos, rezo também pelas almas daqueles que a jurisprudência teológica afirma que devem estar no Inferno. Alguns são meus amigos; outros, gente que nunca vi: escritores, músicos, pintores, musas, doidos que apenas se perderam no caminho. Rezo por todos. Não posso acreditar que Bill Evans, por exemplo, seja lá onde esteja agora, não acabará no Céu – talvez contra todos os cálculos teológicos e magisteriais. Nessas horas, me amparo nas bem-aventuranças do Sermão da Montanha, um alívio para as almas desassossegadas, e lembro da simpatia que Jesus devotou aos rebeldes e desprezados.

Enfim, rezo. É de graça.