Saio pela rua em busca de uma crônica. Tenho já um texto pronto, mas não me parece que ele faça jus a esta manhã ensolarada, depois de tantos dias de chuva. Tampouco está a par com o que me vai por dentro. É preciso encontrar palavras mais genuínas, deixar que elas se derramem sobre mim como raios de sol e se espalhem por aí, tocando o coração de cada leitor o mais fundo que puderem. E ao menos um, especialmente.
“Onde está teu coração agora?” Eu me pergunto e é bom imaginar que os raios de sol são como pontes, linhas de ligação entre mim e o sol e entre mim e você; que esse mesmo sol que me banha também banha você, onde quer que você esteja agora, e então é possível, sim, que você me ouça os pensamentos que lhe devoto, apreensivos e esperançosos. E eu os seus.
“Onde estará teu coração agora? Que palavras o traduziriam? Ou que silêncios?”. Vou pensando em você, desejando penetrar teu coração…
Mas todo coração é um deserto e um palácio; um imenso labirinto onde há e não há paredes, onde nunca estamos sós e não há ninguém. Estar em um coração é nunca saber se o alcançamos, meu amor. Desejá-lo é já estar perdido. Abandonar-se, o que resta.
Então estou em seu coração quando vago pelas ruas e penso ouvi-lo na luz que o sol me traz. E assim, quase também vejo você suspensa no ar em sua varanda de frente para o mar distante, expondo ao sol o coração oprimido. O que esperas? E para quando?
Eu ouço… Mas serão suficientes as palavras que ofereço? Serei o barco, que desponta nesse horizonte de azuis tão pálidos, ou serei só o vento, que se perde em afagos nos teus cabelos?
O que, enfim, teu coração – de si e para si palácio, deserto, labirinto – consentirá que eu seja?
Eu ouço – e sigo caminhando, imóvel, ao mesmo tempo, barco e vento; ao mesmo tempo, precioso e nada.